O sussuro em Collasuyo

Terror
Outubro de 2019
Começou, agora termina queride!

Conquista Literária
Conto publicado em
O Culto

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O sussuro em Collasuyo
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Dentro dos escritórios da Real Sociedade Geográfica em Londres, foi decidido que os volumes da obra autobiográfica do conquistador espanhol Pedro Cieza de León - que profanou o Peru e a Bolívia, morrendo no ano da graça de 1554 – seriam finalmente traduzidos, porém devidamente censurados em sua versão para o público em geral.

Eu, Clements Markham, nesse ano de 1870, fui incumbido de realizar a tradução do espanhol arcaico para o inglês, sob a vigília constante dos membros da sociedade, que garantiriam que trechos não seriam copiados e contrabandeados para fora daquelas paredes antigas de tijolo a vista da mansão vitoriana em South Kensington, sede da sociedade.

Porém, caro Stevenson Dyer, antigo amigo da Universidade Miskatonic, em Arkham, ao qual eu endereço esse relato, digo que fui agraciado com a maldição de uma boa memória, e na medida do possível, relatarei aqui as coisas inomináveis descritas nos relatos de Pedro de León, principalmente após sua chegada à antiga civilização Tihuanaku, onde hoje se encontra atualmente a Bolívia, mas que na ocasião de sua expedição, pertencia ao sul dos reinos Colla, na região sombria de Collasuyo.

Sei que o amigo deve ter tido conhecimento, certamente o fez, dada sua especialidade em ocultismo, das múmias Incas com crânios alongados, e sei também ser essa uma atribuição culturalmente antropológica encontrada em outras civilizações do passado, assim como outras partes do mundo, como na ásia central, mas espero que o relato aqui transcrito abra sua mente para a real possibilidade mantida em segredo a fim de evitar pânico mundial e propagar a ordem de adoração diabólica a qual tende a tantos interesses em nosso mundo, começando por mantê-lo em seu próprio firmamento.

Começo meu relato a partir da chegada de León na pirâmide da civilização local, aonde ele foi recebido pelos sacerdotes locais, já como representante do novo governo espanhol que depunha sistematicamente a hegemonia inca anterior. Montados em seus cavalos, animais jamais vistos naquele continente até então, eram recebidos como divindades e tratados como tal, inclusive em seus rituais e partilhamento dos mais altos segredos locais. Afinal de contas, aos olhos dos sacerdotes, estavam apenas compartilhando informações dentre os deuses antigos e os deuses novos. Certamente se os sacerdotes Tihuanaku ousassem pensar na possibilidade de humanidade de León e sua comitiva, eles jamais teriam saído de lá com suas cabeças sobre os ombros após terem vislumbrado tudo que testemunharam.

Apresento aqui a primeira discrepância entre meu relato e a tradução oficial apresentada pela sociedade real, na qual eles afirmam que León havia encontrado a pirâmide soterrada ao chegar na cidade, fato que é uma grande mentira, visto que os principais acontecimentos, narrados por 2 dos 5 volumes que ele trouxe consigo das Américas, haviam sido dedicados inteiramente a descrição dos acontecimentos e pormenores ocorridos dentro da pirâmide, tendo sido completamente censurados ao público geral inglês. Neles, fica claro o motivo dos sacerdotes locais terem demandado tanto esforço após sua fuga, de forma a soterrar e a selar para sempre os segredos ali contidos, a fim de que tal blasfêmia ao compartilhar segredos dos verdadeiros deuses com os hereges jamais se repetiria. Ainda hoje a pirâmide permanece soterrada, e as novas maldições impostas ali garantem que assim o ficará por toda eternidade.

Embora muito do que León descreve do interior da pirâmide tenha sido estonteante para ele, para nós, pesquisadores do século 19, já seriam relatos corriqueiros visto nosso conhecimento de outras pirâmides Incas, então vou me ater as fatos extraordinários ocorridos em seu relato. O primeiro deles era o odor. León declarou como um cheiro quase visível aos olhos, de tão carregado, e embora o lembrava do cheiro de crisântemos, sua carga era tal que lacrimejava aos olhos. Outro ponto era a temperatura, extremamente fria no interior da pirâmide, mesmo para os padrões frios do altiplano andino. Com relação aos sacerdotes, sem exceção, todos tinham seus crânios alongados, e suas cabeças mais se pareciam com pepinos dado a aparência oblonga dos crânios.

Sei que até agora nada de extraordinário foi relatado, mas o que espanta foram as sensações obtidas por León, visto que a imposição dele ter sido levado ao interior da pirâmide foi a de ser vendado, na verdade, foi obrigado a usar um capacete de junco cobrindo toda sua cabeça, a partir dos ombros. Ele jura em seus relatos ter sido levado a presença de uma criatura gigantesca que vivia no interior da pirâmide, a qual ele apenas vislumbrou pequenos trechos de texturas monstruosas, juntamente com o advento de milhares de olhos incrustados na pele, visto por ele através de pequenas frestas entre os juncos de seu capacete.

Ele relatou a nítida sensação de que no local acontecia também a fecundação das mulheres locais por essa criatura, dados os sussurros femininos em forma de prazer indistintos de um terror absoluto, e que os bebês provenientes dessa união profana eram justamente a linhagem de nobres de crânio oblongo cuja a qual os sacerdotes também faziam parte. Eles se chamavam os filhos de xogoti, em sua própria língua, mas isso me remonta foneticamente ao termo shoggoth o qual estudamos na Miskatonic, e tanto você quanto eu sabemos o significado maléfico por trás desse termo.

A sociedade real simplesmente destruiu esses volumes, declarando que León havia ingerido cogumelos ritualísticos junto aos sacerdotes e vislumbrado apenas alucinações causadas pelo cogumelo Amanita muscaria ou similar, altamente alucinógeno e presente no altiplano andino. Mas isso não explicaria a similaridade entre xogoti e shoggoth, assim como a descrição do monstro visto por León também se enquadra na descrição de um shoggot, assim como a vimos na única cópia dispónivel do livro Necronomicon, guardada a sete chaves na universidade Miskatonic. Esse é apenas o relato inicial, mas não o mais importante, feito por León, meu caro amigo.

Ele declarou ainda que se o ritual dos filhos de xogoti cessasse, o mundo inteiro iria ruir, visto que em cada pirâmide da humanidade era dito haver um xogoti e seus adoradores - o que explicaria inclusive a existência de pirâmides em todas as culturas da humanidade, mesmo dentre as que nunca tiveram contato entre sí – e que esses seres seriam os guardiões para portais os quais abririam caminho para dimensões de monstruosidades ainda maiores. É como se esses seres demoníacos fossem os embaixadores dessas dimensões aqui na Terra, e pela continuidade de seitas de adoração, seus chefes em outras dimensões saberiam que nosso planeta estaria sob controle e obediente. Mas no caso dos adoradores cessarem suas atividades, esses seres interdimensionais gigantescos viriam por conta própria requerer esclarecimentos, e apenas para dar exemplo de poder, destruiriam quase que na totalidade a humanidade e a vida por aqui.

Eu tenho minhas suspeitas de que as entidades poderosas em nosso planeta ainda mantém esse pacto sinistro com esses seres interdimensionais, porém tudo no mais alto segredo, pois a mistura incestuosa dentre as nossas espécies com as deles certamente seria uma heresia jamais admitida por qualquer religião do mundo, tão qual a confirmação de realmente existem deuses para a humanidade, mas não deuses bondosos, e sim monstruosidades galáticas, certamente causaria uma calamidade em nossa paz de espírito e capacidade de vivência nesse planeta. Por fim, caro amigo, dada a falta de provas materiais e com a destruição dos volumes originais de León, só resta mesmo nossa palavra contra a deles, sendo que acredito que esse relato possa servir apenas como história para crianças, como seu recém-nascido filho, William. Quem sabe no futuro ele não se torne um explorador e consiga provas desses mistérios ocultos na figura de William Dyer, o aventuteiro.

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