Prólogo
Epílogo
Conto
Colocou a sua capa de chuva que havia sido o último presente que seu pai
lhe deu e desceu pela escadaria cheia de ferrugem. O perigo era duplo, porque se não
bastasse o estado pouco conservado das escadas ainda havia a chuva que ia deixando
tudo escorregadio.
Érika somente respirou aliviada quando sentiu o chão frio embaixo de seus
pés.
— Pensei que você tivesse mudado de idéia.— disse Rogéria, sua melhor
amiga, no momento em que se encontraram. A menina tinha um irmão gêmeo chamado
Rogério e os pais acharam que seria uma boa idéia os gêmeos terem nomes
iguais. O menino também iria com eles na aventura porém as esperava perto da
ponte que seria o ponto de encontro para que depois seguissem rumo ao cinema.
— Eu disse que vinha não disse? Mas essa chuva não ajuda muito. — disse a
menina se colocando debaixo da sombrinha da amiga. As duas riram juntas por um
momento. Estavam animadas, mesmo que ainda não tivessem escolhido o filme.
— O Rogério ficou na ponte coberta porque ele não queria pegar chuva, ele
queria que eu ficasse com ele, porém não ia deixar você vim sozinha.
— Agradeço, amiga.— disse a menina pensando em como tinha escolhido
realmente bem a sua melhor amiga.
Érika sabia o porque da amiga ter vindo a acompanhar, não tinha muita relação
com a chuva, tinha mais relação com o fato de que a rua estava meio deserta.
No chão várias poças haviam se formado. Caminhava com cuidado, porém
isso não impediu que seu pé afundasse em uma delas. Ao olhar para baixo a menina
pensou ter visto algo de diferente naquela poça. Era como se um líquido vermelho
tivesse sido diluído recentemente e ainda não tivesse se misturado completamente
com a água.
A garota estava de sapato fechado, mas ficou preocupada de ter algum corte
escondido e o sangue ser dela, porém logo reparou que essa teoria não era válida, pois
passou o resto do caminho reparando nas poças e notou que a situação se repetia em
todas. Começou a ficar com um certo medo, pois era quase como se tivesse gotejando
sangue de algum lugar diretamente nas poças. Olhou para os lados e não viu nada
de diferente. Saiu de baixo da sombrinha por uns momentos, para olhar para o alto,
mas novamente tudo conforme a normalidade. Porém o medo crescia a medida que
foi notado que o líquido vermelho foi ficando mais forte a medida que avançavam.
— Rogéria, acho que tem algo de errado. Olhe para as poças de água.
A amiga estava distraída pensando no compromisso que teriam e nem olhava
para o caminho.
— Érika, estamos meio atrasadas. Deve está uma fila do lado de fora do cinema,
ainda mais que hoje é entrada franca. Além disso, essas poças parecem úmidas
e normais como todas as outras.— disse não passando nem dois segundo olhando
para as poças e depois completou olhando para amiga— Deve ser o tempo frio que
lhe faz imaginar coisas.
Ainda ia falar mais alguma coisa, porém o barulho de um carro se fez ouvir,
dessa vez Rogéria ouviu também e ficou meio tensa. O veiculo parecia está andando
lentamente, o que não fazia muito sentido, pois a rua estava deserta e não tinha
motivo para que ele fosse nessa velocidade. O medo aumentou quando o veiculo
começou a segui-las de forma lenta e sinistra. Olharam-se pensando se correr seria
a melhor opção.
A maioria das janelas estava fechada por conta da chuva então pensaram que
gritar talvez não fosse uma boa opção, pois poderia apenas irritar mais o seguidor
delas e talvez o socorro não chegasse a tempo, porém não conseguiram conter o grito
quando a porta do carro começou a se abrir lentamente e um braço enluvado fez
menção de puxar uma delas para dentro do carro.
Correram sem direção, o cinema e os amigos ficaram esquecidos assim como
a sombrinha caída em algum ponto, depois de um tempo notaram que não tinham
para onde correr. Estavam diante de uma rua sem saída. O carro parou e ouviram
passos se aproximando cada vez mais rápido. O homem do carro deve ter percebido
que era mais simples as pegar sem o carro. Haviam as encurralado naquele local.
O medo tornou o clima ainda mais frio. A chuva estava um pouco mais fraca,
porém o local continuava meio deserto. Mesmo cega pelo medo a menina reparou
que as poças voltaram a ficar com o vermelho diluído. Sentiu um líquido mais espesso
molhar a sua cabeça e escorrer lentamente.
O homem mau e o capanga dele as encarou com um sorriso maldoso se aproximando
de forma lenta como um leão que ver as presas. Um deles segurava uma
faca. Encostada na parede da rua sem saída Érika começou a sentir o líquido espesso
gotejar ainda mais chegando a molhar sua blusa e casaco. As poças próximas começaram
a ficar ainda mais vermelhas. Foi quando ouviram um barulho como de bater
de asas e por um momento foi como se o tempo parasse.
Um ser pousou na frente delas, se colocando entre as meninas e os homens.
Ele tinha longas garras e dentes afiados. De sua boca semi-aberta uma gosma vermelha
escorria, parecia sangue misturado com outra coisa mais pegajosa. Os homens
que eram os predadores se tornaram as vítimas. Com apenas um rápido movimento
da garra do dedo menor, que era afiada como um bisturi, o monstro cortou o rosto
do homem e logo depois o peito que segurava a faca e o obrigou a derrubar a arma
no chão. O outro homem ao tentar fugir sentiu uma dor nas suas costas. Era a garra
maior do monstro que entrou atravessando músculos e ossos e atingindo em cheio o
coração que ainda tentava bombear o sangue.
A criatura olhou por um momento para as meninas, mas desde o começo
Érika sentiu que ele não ia lhes fazer mal. A criatura levantou voo carregando um
daqueles homens e deixando as meninas ainda assustadas para trás. O sangue do
homem escorria e pingava em uma poça próxima, o vermelho se diluindo as poucos
na água parada.