Prólogo
Epílogo
Conto
Alice. She’s reading Shakespeare. Sim. O bigode do próprio autor a inspira.
Quer consertar a geringonça! Ele se aproxima apaixonado e seu bigode imita Salvador
Dalí. Sorri brandamente. Quer fazer sexo com Chico Buarque... Por quê? Indaga
curiosa. É apenas a imagem, responde amoroso...
Não deixaria ele se aproximar, pensou Alice, e evocou o que a imagem lhe
dizia. Éramos papagaios na vida passada, respondeu reclusa. A resposta da menina o
encorajava. Poste-se qual Alice no país das maravilhas! E vamos brincar de cinema.
Apagou as luzes e a comeu.
Passados cinco anos, espreitavam as pessoas aglomeradas na festa do Oscar.
Que chique! Perambulavam de mãos dadas a impressionar o público, tão restrito em
seus desesperos. Queriam paz e foram-se para dentro. O vestido de Alice brilhava ao
tempo em que Salvador, Shakespeare na verdade, emplumava-lhe as mãos: eram o
mais belo casal...
Não ganharam prêmio algum e partiram na geringonça consertada. Mas, o
público ainda os espreitava...
Fugiram solícitos. Prosseguiram à história. Os pelos da perna de Alice faziam-
na parecer um homem. Não havia refúgio, então, dormiram na geringonça
mesmo que havia sido programada para o sul. Encontraram ao chegar ali uma menina
esperta. Tornou-se amiga deles e pôs-se a cantar: Tuas pernas ejaculam, qual a
foice de Mattar, são dois pelos clareados, que não dobram por passar, arranque mais
certo os que aparecem bem nas coxas, pois a cera empelotou... Entendiam os porquês
da criança e a adotaram para si. Quando Telma entrou no que parecia ser uma nave,
imperou lúcida. Shakespeare vai me matar!Proferiu branda. Vai sim, concordaram
os adultos e Dalí partiu para o refeitório. A sala era suprema. Sim. Localizava-se no
patamar e a vista era ampla. Lembrava a cúpula do teatro municipal de São Paulo.
Havia um piano ali também. Alice começou a tocar uma música clássica e deixava
sua voz permear a música até o momento em que começou a gritar: Ave Maria! Não
se Aborreça! Pediu Shakespeare... Não podia se desvencilhar do personagem Dalí,
já que ambas não o reconheciam nesse estado. Imediatamente apareceu o garçom.
Parecia um extra-terrestre, pensou Alice. E protegeu a menina de qualquer fator que
o fizesse revelar. Impossível captar sua história e num rompante. Disse: -O senhor
está pálido! A educação do homem foi excessiva. Permaneceu sorrindo por alguns
minutos. Trouxe o espelho da menina que estava guardado em seu aposento. Cuidado
para não refletir por sobre o filme plástico, prosseguiu, é capaz de o material queimar.
Não se queimará não! Gritou Telma. E refletiu bem no centro do cartaz. Alice
caiu no chão despencando sobre o tapete. Batia as mãos tirando a poeira dele até
produzir uma nuvem de fumaça. Vamos embora daqui! Shakespeare estava cansado
de tramas sutis. Propuseram ir ao convés. Miguelito, o garçom os conduziu. Lá fora
conversavam todos sentados nas espreguiçadeiras, menos Miguelito. Este não se envergonhava
de ter um nome no diminutivo. Mil, o apelidaram. Também gostou da
ideia e começaram a jogar gamão. Telma a não entender nada do que se passava abriu
uma portinhola e ali estava situado o anão Vulcão. Começou a conversar com ele e
sentiu um pouco de medo, mas logo o apresentou aos amigos. Vulcão já tinha certeza
que Miguelito era realmente um extraterrestre. Permaneceu em segredo. Não
podiam enfraquecê-lo, pois sorviam as energias de modo a imperarem no convés.
Vulcão esticou a coluna para cumprimentar os homens. No âmbito do tempo surgiu
uma nuvem de fumaça que encobriu toda a geringonça. Então entraram de roupa
na piscina. Era delicioso se molhar em tal fumaça. Não sabiam ainda se se tratava de
fumaça proveniente de combustão ou névoa. Pouco importava. Telma nadava peixinho
e os outros mergulhavam até o fundo de seis metros. Tocavam a mão no chão
para ver quem vencia. Alice voltou primeiro. O que faziam os homens no fundo da
piscina? Queriam impressionar as mulheres? E o vapor da água subia e descia rumo
à sala de calefação. Foram todos para lá. Estava aquecida. Nenhuma roupa ficou pendurada
ali. Preferiram estendê-las na lavanderia. Nus estavam neste outro aposento.
A menina resplandeceu em timidez. Não olhava nada e eles permeavam a bruma que
os encantava. Estavam no paraíso? Pensou Miguelito. E foi ao cabeleireiro fazer um
estilo punk de corte. Desvencilhados de Miguelito sabiam não estarem em guerra,
mas encontraram Chico Buarque de Hollanda amaldiçoando tal Geny. Cantava supimpa!
Simplesmente localizava-se a estibordo. Como aparecera ali? Viera de um
Brasil miserável repleto de favelas e morros retalhados por vidas pedintes? Lógico
que teletransportára-se até ali. Fariam uma festa para provar a existência dos cinco.
Posso trazer a Gal Costa. Somente se cantasse a noite inteira. Dito e feito. Chegou
laminada e imperou no palco do teatro. Também no palco do refeitório depois da
meia-noite. Cansou-se e foi dormir. Deitou na casa das máquinas. Era o único lugar
possível. E foi embora de helicóptero no dia seguinte. Deixara um livro para todos de
presente: o dicionário das palavras extintas. Começaram a ler. Lux. Luz. Vate. Retro.
Passaram o dia assim. Depois projetaram o filme: A viagem do Capitão Tornado...
Acabada a história, leram também Vento das Pedras que estava escondido entre os
cobertores do closet principal. A partir daí rumaram sem rumo algum. Velavam o
corpo de Ornella Muti e a colocavam despropositadamente em vanguarda. Estava
viva, mas não respirava. Permanecia diva mantendo o modelo de beleza. Era uma
cena. Imaginavam apenas a rapariga a imitar branca de neve, tão pálida, tão jovem.
Porém, eram castigados sem saber. O anão vociferou: uma vaca! E foi preparar umas
codornizes junto a Miguelito. Em sânscrito pensavam. Uma prostituta maravilhosa
seria capaz de enfeitiçar Alice. Aliviaria seus instintos bissexuais ultrajando a cidade.
Estavam errados: Qual era o nome do anão? Não lembravam e o obrigaram a manter
relações sexuais com Ornella. Assistiam tudo com sadismo. A presença em ectoplasma
de quem escrevera tais perversidades não era revelada e Sodoma ruía sobre suas
cabeças. O pôster de Anais Nin fora equilibrado no tripé do hall.
É o momento de voltarmos, proferiu Telma, já adulta e arregaçada pelo novo
namorado. Tinha um caralho mais grosso que o normal. Proibiram-na de cantar. Vivera
a música de forma drástica. Sofria com tal decisão e emancipava a escrita. Quando
cantamos muito, a voz precisa se restabelecer. Vivi isso sem orgulho e acredito
meu marido ser o imperador da China. Sabia cantar sete meses seguidos sem prejudicar
a bendita. Era o que queria mais. Preparava-se para cantar especialmente para
hermafroditas. Portava-se futurista. Como as flores em relação ao espaço sideral.
Poéticas, exuberantes e simples ao mesmo tempo. Alice diminuíra de tamanho. Que
trágica! Perdia-se novamente na saleta do tronco de árvore a destrancar fechaduras
especiais. Uma dera acesso à sala onde Karen Magnética fora presa. Originara-se esta
Karen em sua própria sala de estar. Entre reverberações de luzes e cores. Nem das
fotografias lembrava-se até este dia e seus pais apareciam em Saturno numa viagem
que fizeram em lua de mel. Impossível. Nascera com dezessete anos. Porém casara-se
aos vinte e dois. Outra estória pra contar. Enfim, no país das maravilhas, os soldados
eram estupradores e a perdição amalgamava os poetas. Todos os homens relegados
ao esquecimento. A sífilis devorava os justos e ninguém perguntava por que até morrerem
em acidentes aéreos e automobilísticos. A estupidez das pessoas gera tamanha
prolixidade! Pensou. Separaram-se dos outros: Alice e Telma. Alice infantilizada pela
abundância de aventuras e Telma sóbria a ponto de parecer Bernarda Alba. Agora
encontraram Júlia, a vilã de Bernardo e Bianca do Walt Disney. Havia mudado de
nome, mas ainda morava em Chicago. Ou não. Tinha duas mansões. Odiava ter de
tirar os cílios postiços diariamente exceto aos finais de semana quando descançava.
Falou sorrateiramente às duas: Os jacarés estão hibernando. E foram visitar a prisioneira.
Era Rita Lee, a filha adotiva dela. Planejaram o assassintato da vilã e foram para
a geringonça. Situava-se entre o triângulo da Bermudas. Nova festa: com centenas
de pessoas a ocupar o saguão principal. O filé-mignon consistia em agradar a todos.
Maria Bethânia figurava onírica na tela de cinema. Interpretava Yerma. Durante as
danças a esposa da Casa de Bonecas extasiava-se independente. A miniatura do edifício
obrigava Tennessee Williams e Eugene O’Neill a iluminarem o recinto. A bomba
explodiu matando a todos. Sobrou Shakespeare.
Tamanha astúcia não suprimiu o instinto do autor. Manteve-se solitário.
Deu um solitário à namorada certo tempo depois. Carmem. Uma bailarina flamenca.
Não queria mais geringonças. Agora o must seria uma máquina do tempo, ou mesmo
uma nave espacial. A diferença era: a nave viaja no tempo, mas a máquina faz você
sonhar. Pouco importa as pessoas da história. O heroico seria permanecer fiel...
Reunira todos no passado novamente. A era Vitoriana trouxera Orlando interpretado
por mim. Evocava Diadorim quando era obrigada há permanecer quinhentos
anos na banheira de luxo. Chamei João. Trouxe a esposa. Comemos salada
e lasanha. Confesso que achei meio esquisito. Costumava me imaginar abraçada por
trás num cartaz de filme. Antonio Banderas apertava meu corpo com força e eu expressava
a essência do tango em um rosto extremamente maquiado. Éramos bandidos
a se amar. Havia me casado no início da película com um amigo e o traía. A
cena de meus lábios sendo pintados para entrar na igreja me deixava nervosa. Dirigia
periculosamente na praia atrás de Antonio que já estava morto. Chorava e gritava
ao saber a notícia... Almodóvar dirigira a história. Fácil aprender alemão. Difícil é
articular em hebraico. Não sou...
A partir daqui fodo com Shakespeare. Ele está inspirado. Tem um pênis delineado
e vascularmente excitante. Abro as pernas para ele diante do espelho e ele me
penetra por trás. Estou sentada em seu colo e peço para enfiar só a cabeça... Umas
vinte vezes... E olhamos nosso sexo a tremer... Sua força consegue manter minhas
pernas bem abertas e posso então gemer: Rogéria... Nossa futura filha... Nasceu de
uma relação ilícita. Espero que meu amor seja fiel a mim mesmo após a morte. Acho
pecado a relação sexual gratuita, porém não desfaço rendas. Sou a bruxa de Paranapiacaba
e quero fazer sucesso neste mundo tão cruel. Já vivi o martírio. Então Jesus
me disse: serás feliz. Realmente acreditei e os momentos epifanicos de minha trajetória
não renegam a atenção que mereço. Invejo Shakespeare pela sua astúcia. Teremos
gêmeos: Juca e Chico. Dois personagens impossíveis de tão cruéis. Também
enforcaria Judas qual pagã sobre o andor. Quero geleia de morango. Estou grávida
de São João. Isabel é fichinha perto de mim. O que há? Achas que não sou capaz?
Vejo-te lúcido sobre o túmulo. Ressuscitaste do inferno. Olhas como quem já partiu
desfazendo impérios. Anda, pois, devagar a lavar o sangue de uma glória perpétua
que ninguém acreditará logo depois. O cheiro de teu corpo elucida o lugar. Plana
etéreo... Realça a luz evacuando o silêncio... És meu...
O tempo foi capaz de nos teletransportar até aqui meus caros amigos. Lembro
um arco-íris brilhante que vi quando era criança. Sou um pouco clarividente.
Também já vi um anjo azul-brilhante maior que um ser humano. Seu rosto emanava
vermelho e veio me avisar de minha gravidez e me alertar do perigo. Não tente me
assassinar de novo alma cruel. Temos mil anos para nos vingar. E a Terra que perderá
a água fará sua miséria distante. Quererás chuva, ela não virá, morrerás de sede e
os insetos devorarão desesperados a tua plantação. Vossa vontade é o estorvo da violência.
Chego ao fim de mais uma história. Então posso sorrir para qualquer um na
rua como a estúpida Macabéa. Sim Clarisse, vamos nos dar as mãos. Correremos voando
sobre a plataforma. Esculpi sua estátua e não me envergonho. Fui à profundeza
dos abismos. Minhas poesias eternizaram as crianças e Cecília já pode voar. Somos
musas inspiradoras a atiçar Mefisto em terrenos aplanados. O chão enlameado nos
faz escorregar por sobre um mundo pequeno e abarrotado. Impeço-te de prosseguir.
Shakespeare vem vindo. Múltiplo. Sincero. Quer adotar cem Dálmatas e se traveste
de Malvina Cruela.
Tiramos corpos de caixões. Trabalhamos no cemitério. Os preservados viram
velas onde os cristais ocupam o aquário da menina manca. Quem preferiu ostras,
hoje prefere camarão frito. Preciso reler A Bolsa Amarela, pois não relembro o enredo.
Mas guardo segredos. Onde cabe tudo. Até pergaminhos métricos...
Você está muito curioso para saber o final de tudo isto. E o final é:
Estamos a caminho de Saturno. Viagem de férias. Na própria geringonça. Os
temas são dados. Já estou na quinta página e quero me livrar de Batman. Não posso
narrá-lo qual herói, pois estaria desenraizando outro Robin. Completamente diferente
do que já existiu. Prefiro, agora, os personagens do meu país, quais os personagens
de Chico naquela canção: agora eu era herói... e o meu cavalo só falava inglês...
Marieta está desesperada para sair da caixa mágica. Prevejo a morte dos entes.
Minha lua é em touro...