Prólogo
Epílogo
Conto
Névoa clara e gélida que corta o corpo como navalhas em garoa. No tempestuoso
momento por essa estrada não caminho à toa.
Na treva sombria um corvo negro me guia, coração arranhado pela impureza
do amor e a triste desilusão.
Caminhando como Adão, até o linear da escuridão. Dos ossos ao pó e das
cinzas ao fogo, a impiedade neutraliza o meu ego.
A maçã que levaste ao pecado não declina apenas minha alma ao relicário, a
mordida da tentação é traiçoeira assim como o prazer da carne passageira.
Seu instinto voraz que acerca o meu pescoço, “doce vampiresca”, talvez meu
alento não a apeteça. Tão obscuro quanto um poço, cega meus olhos e esgarça nas
rochas em volta o meu sangue.
Sedutora vampiresca, meu sangue não é o vinho que delicia sua sede e a chama
de minha aura não é a luz do seu submundo.
Vampiresca, mesmo com a pele seca o meu sangue a alimenta, não deixe
pingar sequer uma gota destes dentes, ao roubar-lhe um beijo quero de volta minha
essência. Manjar manchado que derrama sobre sua saliência, me poupe da luxúria
pecaminosa que incendeia minha veemência.
Não fraquejo diante da morte, sou um velho conhecido do barqueiro Caronte.
Se este meu sangue não for capaz de saciá-la, talvez o amor que nutre nas minhas
veias a façam se apaixonar. No caminho dos ímpios é inquestionável a avareza, mas
é indubitável a certeza de que a dor em seus braços me satisfaz.
Hades não condene minha alma, a linda vampiresca me acalma, estava na
boate quando me tornei a presa para o abate, sedução disfarçada de sensualidade
sepultaram minha razão com ociosidade, na penumbra da espelunca o seu vulto me
persegue, assim como seu cheiro que me atiça ao desejá-la.
Acalma-te, não me venha com este sorriso rasgado, jaz sua língua em sangue
injustiçado inundada, apara-te as unhas. O calafrio lascivo e corpóreo me leva ao
purgatório. Lamento “vampiresca” o amor doentio que sinto, enquanto suga minha
esperança em desalento.
Seus braços são um açoite em ranhura delicado, talvez este coração pulse
apaixonado, dama da noite e princesa da escuridão me transporte ao outro lado e que
o chicote da justiça me absolvam deste pecado.
Leve-me ao seu submundo, mesmo lá onde o sol não paira te darei os campos
Elíseos. Minha bela vampiresca sua sina é de uma audaciosa menina, diante dos
trechos em chamas que ardem e queimam os meus ossos, flagelam incessantemente
as minhas entranhas.
Vampiresca pode chamar de inferno ou reino dos mortos, mas na terra contigo
é o meu lugar. Quando a viste nesta boate dançar, não imaginava que o meu
coração conseguiste arrebatar. Sua dança sensual que vieste o meu “Eu” a hipnotizar,
não se conteve diante da beleza áspera e sofredora ao me mordiscar.
Véu da lua ensanguentado míngue pela estrela ao seu lado, como levarei luz a
um lugar malfadado. Belíssima vampiresca não julgue minha alma e não leve minha
vida dentre os lábios, mesmo entre os sábios o amor não existe lógica ou explicação,
aprecie esta súplica até quando meu espírito partir.
Poupe minha vida, já vi diante dos teus olhos negros as portas do além, apesar
de sombrio ainda assim é mágico, quem dera foste alucinação, me entregar a esta
paixão fúnebre que me acalanta em um réquiem de cordas. Cesse a harpa melodioso
Orfeu, não emita o som da enganosa ilusão, pois ainda meu corpo não pereceu.
Veja a neve lá fora congelaste, assim como o teu semblante que desapareceste.
Faça-me um sepulcro de gelo, contemple minha existência por toda a sua imortalidade.
Neste gelo que espelha em sua alma, não desanime, mesmo entre os esquecidos
a redenção é possível.
Devoradora vampiresca, como se não bastasse o sangue sugaste a trova da alvorada,
não impeça os anjos querubins de cortejá-la, mesmo na sombra existe beleza.
Leve-me contigo ou me esqueça, até que neste frio o meu corpo compadeça. Retire o
sabor de sangue em sua boca, deixe-me adoçá-la com esses sentimentos, no labirinto
promíscuo a pelugem da noite ma acoberta.
Debruce sobre mim, não se desprenda, fique comigo, a eternidade é uma
criança assustada sem morada, de pesadelo ao sonho, afinal o que seria tudo isso.
Acorde meu querido Adão, sofreste uma alucinação. Impossível de acreditar tudo
parecia ser tão real igual ao seu rosto terno que vejo agora. Sorriste com delicadeza,
afastando-se com um riso e dentes afiados e avermelhados. Não foi um pesadelo de
amor, tão pouco um sonho de transcendência, obscureceu o tempo e linha tênue da
vida profanou.
Vampiresca, se por um vislumbre a eternidade a trouxeste, todo o sangue que
corre em minhas artérias o teria eternamente. Não quero a luz do mundo, mas sim
ao sombrio e estanho mundo no qual você me baniu, pois visceral é o amor que sinto
por você. Se não for para sempre, que seja por algumas horas, que este sangue em
meu coração possa bombear até a última gota capaz de lhe saciar.