Laços distantes

Terror
Maio de 2020
Começou, agora termina queride!

Família Margarina

Conquista Literária
Conto publicado em
Os irmãos da Rua Ímpar

Prólogo

Epílogo

Conto

Áudio drama
Laços distantes
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— Carlos, você está aqui? — perguntou o psicanalista com seu bloco de notas em mãos.

  — Estou aqui, doutor. Tive apenas um lapso.

  — Entendo... — Michel fez algumas anotações. — Está conseguindo dormir bem?

  — Não muito. Sinto que toda vez que eu durmo, não é apenas um sonho, mas sim uma realidade paralela — Carlos encarou o doutor. — Consigo sentir cada detalhe naquele mundo.

  — Mas o que esse "mundo" quer te contar, Carlos?

  — Não sei, mas sinto a perda de alguma coisa.

  Por um breve instante os dois ficaram em silêncio. Até Michel voltar a falar de novo:

  — Se coisas assim te assustam, talvez você devesse procurar a família. Há alguém de confiança?

  Carlos divagou... seus pensamentos encontraram a única pessoa cuja qual ele depositara toda sua fé: sua irmã do meio, Sophia. Porém, faz anos desde que os dois conversaram ou até mesmo se encontraram. Desde os acontecimentos sobrenaturais na sua infância e posteriormente na adolescência decidiram se distanciarem.

  Mesmo assim, ele tomou coragem para numa manhã de segunda-feira pegar um ônibus direto para a capital, onde Sophia trabalhava — segundo o Instagram. O prédio era bastante grande e várias funcionárias trabalhavam lá.

  Com um sorriso largo no rosto uma delas gentilmente aproximou-se de Carlos:

  — Bom dia, senhor, posso ajudá-lo?

  — Sophia está?

  — Está sim — respondeu ela analisando o rapaz de cima a baixo. — Tem assuntos a tratar?

  — Digamos que sim. — Carlos pôs as mãos no bolso.

  — Siga-me, então, por favor. — A serviu como uma guia, passou por diversos lugares daquela loja até chegar num escritório vazio, mas muito bem arrumado. — Pode aguardar aqui, senhor?

  — Claro — respondeu Carlos, olhando ao seu redor, impressionado com a arrumação do local.

  Sentado numa poltrona, ele esperou por alguns poucos minutos, distraído por um quadro da renascença. Então, uma voz doce chamou sua atenção para a porta. Sua irmã finalmente apareceu! A mesma havia mudado muito desde a última vez que os dois se viram, agora, era de fato, uma mulher. Sua postura de chefe de negócios fez Carlos levantar-se no mesmo instante. Os dois estavam paralisados frente a frente, nenhum sabia como começar, dados os devidos acontecimentos passados.

  — Você aqui? – ela falou, ainda na porta.

  — Não vai me dar um abraço antes? – Ele abriu os braços com um sorriso brilhante.

  — Claro, seu idiota – ela respondeu. Mesmo com salto alto, correu pela sala como se estivesse descalça e abraçou o irmão bem forte. Seus olhos encheram-se de lágrimas. Memórias vieram a sua mente, fazendo-a aproveitar ainda mais o momento. — Senti tanto a sua falta.

  — Eu também.

  Os dois conversaram bastante sobre a vida e outras coisas pífias do dia a dia. Até pautas mais sérias serem expostas:

  — Sophia, preciso te falar algo importante. O real motivo da minha vinda...

  — Já imagino o que seja – respondeu ela. Suas mãos estavam cruzadas e seu olhar distante.

  — Então você sabe.

  — Começou faz mais de uma semana. Parecia um sonho mas não era. Foi aí que vi aquela coisa... me chamando. – Sophia olhou para o irmão sem piscar. — Sinto algo ruim.

  — E Hugo? Conseguiu falar com ele?

  — Tentei ligar, mas só dá caixa postal. Ainda não tive tempo de ir visitá-lo.

  — Onde ele mora? – Carlos levantou-se. — Precisamos ir lá agora!

  — Calma, vou com você. Estou de carro.

  O celta vermelho cortou a cidade numa velocidade invejável. Passaram por pontos turísticos, multidões, prédios abandonados... Cada distância percorrida era uma eternidade para o tanto de pressa que os dois tinham. Por fim, chegaram.

  — É aqui? – perguntou Carlos ao ver o estado degradante da casa. Coberta por musgos e caindo aos pedaços.

  — É sim. Muitas coisas aconteceram desde que você sumiu, irmãozão.

  Ambos saíram do carro e foram para a porta da frente da casa. Bateram com força para chamar atenção, mas era como se ninguém morasse ali há anos.

  — Eu dou um jeito. — Sophia pôs a mão na terra de um dos vasos com plantas que enfeitavam o lugar. Mexeu por um tempo até tirar da terra uma chave. — Hugo não sabe dessa cópia. Nem imagino o que ele faria se soubesse... por isso escondi aqui.

  Sem grande esforço a porta de madeira foi aberta. Ao acender o interruptor, os dois deram de cara com móveis revirados, roupas pelo chão, alimentos estragados e outras sujeiras.

  — Hugo! — gritou Sophia.

  Não havia ninguém mesmo, o que fez a preocupação aumentar.

  — Se ele não está aqui, só resta um lugar — disse Carlos.

  — Na rua par? Por favor, não...

  — Sim. E só há um jeito de ir para lá.

  Os dois deitaram-se num enorme colchão velho do único quarto da minúscula residência. Ao fechar os olhos, puseram em seus pensamentos uma luz de esperança, com fé de encontrarem o irmão perdido. Carlos sentiu seus olhos pesarem e logo ouviu um sussurro no seu ouvido. Uma voz clamava por ele, pedindo para o mesmo acordar. Seus olhos abriram novamente. Porém, agora, o lugar não era o mesmo, ele estava deitado numa rua escura, com casas em preto por todo o redor.

  — Sophia! — gritou o irmão mais velho desesperado.

  De repente, algumas sombras em formas humanóides saíram das casas. O barulho chamou a atenção delas que, de forma lenta, caminharam para perto de Carlos.

  — Aqui! — Sophia respondeu por trás de um dos postes.

 

  Seu irmão a acompanhou, deixando as sombras para trás.

  — Não chegue perto dessas coisas — advertiu Sophia.

  — Nem precisa lembrar. — Carlos olhou para a cicatriz no braço esquerdo da irmã e relembrou, por um instante, a cena cuja qual algumas sombras encurralaram-a e sugaram sua energia vital.

  Os dois andaram alguns minutos, enquanto o vento frio batia em seus rostos. Então, pararam em frente a uma enorme casa de pintura branca, a única diferente de todas as outras. A casa da infância sombria deles.

  — Prometemos nunca mais vir aqui — disse Sophia.

  — Eu sei.

  Dentro da inusitada casa tinham alguns móveis de época bem desgastados. Era como se o tempo não tivesse passado ali, tornando tudo reconhecível. Ajoelhado no centro da grande sala de estar, estava Hugo, com as mãos juntas.

  — Hugo! — gritou Sophia antes de ir abraçá-lo. — O que tá fazendo aqui?!

  — Não temos tempo! Segure na mão dele, feche os olhos e vamos começar a despertar — ordenou Carlos. — Nosso outro irmão está aqui.

  Um grito, quase como um rugido, ecoou por cada canto daquela sala, tomado por uma aura densa e pesada.

  — Sophia!

  — Tô tentando me concentrar, Carlos!

  Surgiu uma fumaça preta diante dos três e formou-se ali a fisionomia do quarto irmão; este idêntico a Hugo falou:

  — Quanto tempo, meus queridos irmãos!

  Sophia abriu os olhos e percebeu que já estava na casa de Hugo, novamente. Para seu alívio, o caçula estava lá.

   — Onde estou? — perguntou ele atordoado.

   — A salvo, Hugo — respondeu, ela. — Nunca mais voltaremos para lá, não é Carlos?

   — Carlos? — indagou Hugo. — Só estamos nós dois aqui.

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