Julgamento Injusto

Steampunk
Setembro de 2019
Começou, agora termina queride!

Conquista Literária
Conto publicado em
O Discurso

Prólogo

Epílogo

Conto

Áudio drama
Julgamento Injusto
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Tomaz Shutter era o juiz da grande metrópole steampunk, a Steametrópólis, uma cidade em peso toda movida à vapor, desde os seus alicerces até os arranha-céus. 

O estilo Steampunk, ou Tecnologia à Vapor é marcado por uso de uma tecnologia mais robusta com máquinas a vapor, fabricações em madeira, cobre e bronze, e o amplo uso de engrenagens. É ambientada no cenário da Revolução Industrial e com pessoas trajadas com indumentárias da era vitoriana.

Alguns cidadãos locais também eram “feitos” à vapor...

Quando se diz “feitos” à vapor, quer dizer que, as vezes acontecia de alguém sofrer um acidente e precisar amputar algum membro do corpo. E para não virar nenhum deficiente, era inserido no lugar algum membro mecânico. E em alguns casos, não era somente simples próteses. Junto, vinha os mais variados tipos de ferramentas, dependendo da profissão do cidadão e em caso mais extremos, eram também embutidos armas.

Foi o início de uma era.

Mas com o passar dos anos, Steametrópólis está caindo em decadência. Conforme vamos progredindo, piores vamos ficando. Era como se estivéssemos nos desumanizando.

_ Acho que o vapor das nossas máquinas está cozinhando o cérebro da população! _ Diz o juiz Tomaz Shutter para o seu assessor e fiel escudeiro, Joshua. Aliás, tanto o juiz e seu assistente também foram “stempunkeados”. Era uma gíria muito usada na cidade, para dizer que a pessoa teve seus um de seus membros amputados por algum motivo e foi substituído por uma prótese.

E o juiz detestava esta gíria com as suas forças. Em um “acidente”, ele teve a perna direita e a metade do braço esquerdo mutilados e no lugar, foram adicionadas próteses de bronze. Seu assistente fora pior. No tal acidente, onde viajara junto com o seu senhor, ele tem quebrou e perdeu a mandíbula. Precisou ser substituída por uma prótese, mas infelizmente tal procedimento comprometeu a sua fala e os seus hábitos alimentares.

Ele não acreditava que foi um mero acidente. A ideia de que alguém tentou acabar com a sua vida, sabotando a Maria Fumaça, a imponente locomotiva que era responsável pelo transporte da população da cidade até os povoados vizinhos, não saía de sua mente. Chegava a ser até meio egoísta para sua parte, pois várias pessoas também estavam naquele trem.

Nem todas conseguiram escapar com vida daquele suposto acidente...

E desde então uma série desses “acidentes” de proporções gigantescas vem acontecendo por toda Steametropólis. E era um pior do que o outro. Um dos boatos que mais se comentava era de que alguém ou havia algum grupo de terroristas tentando sabotar a cidade. Mas quem seria? E por que? Qual era o verdadeiro objetivo dos ataques? Seria algum tipo de protesto? Vingança? Inimigos? Quem realmente era o alvo principal daqueles estranhos desastres? A população? Ou o juiz?

O juiz Tomaz Shutter achava, tinha quase ou a absoluta certeza de que a maioria daqueles atentados que ocorriam na cidade eram direcionados à sua pessoa, ainda que indiretamente. E tinha lá os seus motivos para acreditar nisso...

Ele não era lá uma pessoa muito querida em Steametropólis. Apesar da cidade ter um prefeito, era ele quem mandava e desmandava na cidade e seus métodos de fazer “cumprir as suas leis” não eram muito bem vistas. Uma boa parte das leis da cidade foram criadas por ele... as outras, também.

O desprezo por sua pessoa começa na própria família. Machista até o último fio de cabelo de seu bigode loiro clareado pelo tempo, ele achava ridículo uma mulher entender e dominar os procedimentos da Tecnologia à Vapor que reina absoluta na cidade. Chegou a criar uma lei proibindo tal proeza, mas não adiantou. A cada dia que passava, mais e mais mulheres trabalhavam com as máquinas movidas à vapor, dominantes em Steametropólis.

Chegava até mesmo criar as suas invenções.

Uma dessas mulheres que ousava desafiar a ira do juiz Tomaz Shutter era uma garota de modos nada convencionais... pelo menos para uma dama. Era a típica Maria moleque, se vestia como se fosse um garoto, algumas vezes agia como se fosse um garoto, mas era quando era extremamente necessário, saía no braço como se fosse um homem!

Essa garota, admirada pelo povo, desprezada pela elite e odiada pelo juiz era Nancy Watt, mas muitos a chamavam de Senhorita Engenhoca. O apelido veio devido as suas incríveis habilidades de manusear ferramentas e metais, saber consertar e fazer reparos em todas as maquinas da cidade. Isso quando não as criava. Algumas engenhocas que circulam pela cidade foram idealizadas por ela. E sempre que alguma coisa precisava ser consertada, ela era sempre chamada. 

Segundo as fofocas da população, ela era filha adotiva de um importante cientista, o James Watt. Era na verdade, filha de um de seus criados. A pobre mulher foi abandonada ainda grávida e ele com pena, decidiu ajudar com a criança. Ele foi um dos pioneiros na descoberta da Tecnologia à Vapor. Atualmente, ela domina como ninguém tal a tecnologia e estava sempre com o seu boné com os seus óculos steampunk e seu cinto de mil e umas utilidades.

Para o juiz Shutter, a Senhorita Engenhoca era a principal suspeita dos atentados ocorridos na grande metrópole à vapor, pelo simples fato de uma garota entender de engrenagens, soldagem e parafusos.

_ Mulher e máquina é a combinação mais absurda que já se viu por aí! _ Era uma de suas frases que ele vivia dizendo para as suas netas. Uma delas era a doce e recatada Larissa. Estava viajando junto com o avô no dia em que houve o Grande Desastre de Trem, como conhecido o acidente que aconteceu nas ferrovias.

E assim com ele e muitos naquele trágico dia, ela também foi “steampunkeada”.

Larissa não chegou a perder nenhum membro do seu corpo, mas teve algumas partes que ficaram comprometidas. Perdera uma boa parte dos movimentos dos braços e pernas. Não chegou a ficar tetraplégica, mas tem muita dificuldade em ficar de pé, de caminhar e realizar alguns movimentos. 

_ Pelo menos ainda consegue mover o pescoço sem problemas! _ Disse a sua melhor amiga Nancy.

Sim, a neta e a inimiga do juiz eram as melhores amigas... e ele não sabe.

Nancy ajudou Larissa, criando um cadeiras de rodas à vapor e muletas adaptáveis. Aquilo não vai trazer os seus movimentos de volta, mas pelo menos permitiria que ela locomovesse melhor.

Já a prima de Larissa, Carlota, o acidente fora pior. Ela que sempre foi muito vaidosa e que havia ganhado vários concursos de beleza steampunk, ficou totalmente deformada. Assim como o assessor puxa-saco do seu avô, teve de substituir o maxilar e boa parte do corpo por próteses. 

Se ela já era um entojo de pessoa, agora ficara entojada e amargurada...

As duas primas não sabiam o que era pior: sofrer aquele acidente, ter sobrevivido a ele ou ter de conviver com o avô. Talvez a última hipótese a era pior, pois foi por culpa dele que acabaram daquele jeito. Se ele não tivesse as obrigado a irem viajar com ele, elas não teriam se acidentado.

E se tivessem morrido, hoje não teriam de ouvir os seus desaforos...

Como já foi dito, o juiz Tomaz Shutter era um total machista. Como em qualquer sociedade, os herdeiros homens eram valorizados, assim como ser de boa família. O pai de Carlota, o filho mais velho do juiz era bem casado com uma dama respeitável da alta sociedade Steampunk, mas vivia passeando pela parte mais miserável da cidade, onde ficavam as bocas de fumo e prostíbulos. No final, acabou fugindo com a sua amante que morava por aquelas redondezas.

A mãe de Carlota, sabia das traições do marido, mas ficou indignada com aquela atitude dele. Foi se queixar ao sogro que nada fez. Não queria um escândalo na família e na sociedade. Para todos os efeitos, sua nora havia ficado viúva, ficando à mercê do juiz. 

Para consolar a filha, ela a enchia de mimos e presentes e deu no que deu.

No caso de Larissa, não se sabe se foi pior. Sua mão se apaixonou por rapaz de origem humilde. Mesmo sendo um trabalhador exemplar, o juiz não aceitou aquele romance e armou um golpe para que o pobre rapaz fosse julgado, condenado e preso longe de Steametrópolis. Porém a filha ficou grávida, mas o juiz Shutter somente a deixou ficar na esperança de ter um neto homem. E para seu desgosto, veio uma menina.

No Grande Desastre de Trem, além de ter se acidentado, perdera a filha e a nora, ficando com as duas netas para criar. E isto o deixou ainda mais amargurado.

_ Preferia que tivesse morrido também... assim não iriam me dar trabalho com deram as suas mães... _ foi o que disse na época. E infelizmente elas ouviram.

E aquilo foi muito mais doloroso do que o próprio acidente.

Mas enfim, voltando ao assunto, os acidentes continuavam a acontecer por toda a cidade. Poderia até ser cisma dele, mas toda vez que tais tragédias aconteciam, a tal da Senhorita Engenhoca já estivera no local antes do acontecido, com a sua gangue de arruaceiros, nas palavras dele.

Na verdade, eles eram amigos de Nancy, os Engenho Queiros, que moravam no subúrbio de Steametrópolis e sempre que podiam, iam ajudá-la, seja para fazer algum reparo ou na construção de alguma invenção dela. Isso quando não iam apenas para lhe fazer companhia.

E assim como o juiz, eles também começaram a desconfiar que tem alguém sabotando o trabalho de sua amiga. Um deles chegou a comentar com o grupo, se não era algum plano do próprio juiz Tomaz Shutter, para incriminá-la. Não discordando do amigo, mas Nancy não acredita que um juiz daquele nível se prestara a um papelão desses...

Pelo menos era o que ela achava, apesar de também desconfiar dele.

_ Talvez não seja bem ele... podem ser alguém próximo a ele ou a mando dele.

_ Também não acho que seja isso. _ já era de conhecimento geral que muitos na cidade não gostavam do juiz Shutter. Alguém poderia estar causando os acidentes de propósito na intenção de atingi-lo ou matá-lo. Também já sabiam que ela e juiz não se bicam...

Um arrepio correu por sua espinha. E se o tal sabotador estivesse querendo colocar a sua em suas costas, para que o juiz achasse que fosse ela a culpada? Não seria muita novidade...

Decidiu investigar por conta própria, começando pelo seu grupo de amigos. Não que ela estivesse desconfiando de nenhum deles, muito pelo contrário. Todos ali eram de confiança máxima. Mas quis saber se alguém viu alguma pessoa suspeita no momento do reparo.

_ Se tinha alguém, ninguém viu nada. Na hora da manutenção, ficamos tão concentrados em nosso serviço, que nem olhamos para os lados... _ disse um deles. E isso era verdade. Nancy também ficava muito concentrada trabalhando, que nada ao seu redor importava. 

Pensou seriamente em procurar pessoalmente o juiz para conversar. A ideia não lhe agradava nem um pouco, mas precisava deixar a sua antipatia de lado e tentar unir as forças.

Afinal, Steametrópolis estava em jogo.

Como já imaginava, foi tudo em vão. O arrogante juiz Tomaz Shutter não quis recebê-la. Como nunca aceitava um não como resposta, invadiu o seu tribunal e falou sobres os acidentes. Resultado, foi presa e levada a julgamento!

Toda a cidade ficou sabendo do suposto julgamento da Senhorita Engenhoca. Ela foi acusada pelo próprio juiz de tentar acabar com ele e com a cidade. Para deixar a situação ainda mais difícil, seus amigos Engenho Queiros também foram presos.

O juiz propôs um certo acordo a ela. Seus amigos seriam libertados, caso ela admitisse que foi ela a culpada dos tais acidentes. Aquilo foi demais até mesmo para ele.

_ Não posso assumir o erro de outra pessoa! Enquanto estamos aqui perdendo tempo, tem algum maluco lá fora destruindo a cidade e matando gente inocente!

_ Seus amiguinhos também são inocente... vai deixá-los apodrecendo na prisão, pelo erro de outra pessoa?

Aquilo era golpe sujo. Mas não tendo outra opção, aceitou o acordo e ainda por cima, foi obrigada a assumir os atentados diante de todos.

No momento em que o juiz Shutter ia bater o seu martelo, declarando a sentença, apareceu Larissa em sua cadeira de rodas, protestando contra aquele injusto julgamento. Depois de anos vivendo nas sombras, ela resolveu desafiar o avô para salvar a sua melhor amiga.

_ Como ousa me desafiar Larissa?

_ O seu julgamento é injusto, como todos os outros! Não foi ela! Eu sei quem foi!

Atrás dela, veio sua prima Carlota. Ela não disse nada, por conta de sua prótese. Como sempre Larissa teve de falar por ela.

_ Ela negociou com um grupo de mercenários, vítimas de seus julgamentos, para acabar com o senhor. E para isso, resolveram acabar com a cidade da qual o senhor tanto gosta de mandar. Nos largou a própria sorte e ela decidiu se vingar. 

Todos se comoveram com a atitude das meninas. Apesar de não concordarem com aquela vingança, a cidade em peso perdoou os erros Carlota, principalmente Nancy.

Até porque, ela e Larissa já haviam sido condenadas a terem um avô com aquele!


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