Sinopse
Estamos preparando e revisando este conto, em breve o publicaremos aqui. :D##### Mensagem enviada... Aguardando recebimento do contato... Preparando para leitura Leitor preparado #####
Prólogo
Epílogo
Conto
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Mensagem recebida
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De: Governador Euristeu <goveuristeu@micenas.gov.mc></goveuristeu@micenas.gov.mc>
Para: Arconte Nestor <nestor@conselhonathenas.gov.at></nestor@conselhonathenas.gov.at>
Assunto: Sobre aquele favor...
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Olá Nestor. Faz tempo que não nos falamos, não é mesmo?
Meu velho amigo, estou entrando em contato, como disse que faria quando precisasse. Tenho um problema bastante delicado, e sua ajuda está sendo requisitada. E o problema é um moleque.
Estou abrindo o jogo contigo
O garoto é bom. Pode ter certeza. Você deve ter visto pelos noticiários e pelas postagens na Rede. Ele, mesmo na sua juventude, já conseguia dar conta dos obstáculos e desafios mais impossíveis, dando conta de tarefas que os melhores falharam. Se não tivesse mexido com as pessoas erradas, ele com certeza já seria dono de sua própria empresa de mercenários de elite, ou coisa do tipo. Se não tivesse mexido...
Aliás, eu fico me perguntando o que será que esse moleque fez para a Hera para deixá-la tão irritada. Quero dizer: ele não mexeu como gente poderosa “normal”. Ele conseguiu aborrecer uma Intocável. Entende? Gente poderosa de verdade. Megaempresários tão poderosos que estão além dos Estados, dos governos, dos bancos, dos mercados,... São praticamente deuses! Fazem o que querem, quando querem, onde querem. Ninguém se atreveria a mexer com eles ou se opor a eles abertamente. E, mesmo que se atrevesse, ninguém conseguiria. Eles são tão distantes que só ficamos sabendo deles quando acontece alguma coisa e algum deles requisita algo. Somos formigas perto deles. Mesmo eu, governador de Nova Micenas, ou os grandes empresários apenas assentimos quando um deles fala.
E o moleque conseguiu irritar uma Intocável. Não sei o que foi que ele fez, mas isso mudou muito as coisas. E isso tem tornado a minha vida um inferno.
Vinha tocando a vida como Governador dessa cidade-estado com afinco. Desde a dissolução da Liga do Sul, há trinta anos, pouco antes de eu assumir o governo, Nova Micenas passou por aperto e instabilidade. Foi depois do início de vazamento do reator da usina nuclear botar pânico na cidade. A luz teve de ser racionada. O desemprego aumentou, e eu tive que lutar contra o tempo para impedir uma fuga de capitais de empresas querendo sair em busca de uma cidade-estado mais estável. Quase perdemos tudo para Argos.
Naquele tempo, tudo estava indo pro saco. A cidade estava uma nojeira: esgoto a céu aberto, pixações para todos os lados, falta de coleta de lixo, hospitais fechando as portas, policiais com pagamento atrasado, criminalidade solta. E foi nesse momento que me botaram no cargo de governador, com a missão de arrumar essa desgraça.
Com muito esforço, consegui estabilizar a cidade, apesar de termos sofrido algumas graves perdas. Reestruturei muita coisa. Fiz concessões, privatizações, estatizações, tudo. Botei a segurança nos eixos, e depois fui arrumando os outros problemas, um a um. Pode perceber como a cidade está quase limpa agora <risos>.</risos>
E, há doze anos, mais ou menos, quando estava tudo encaminhado para dar certo, começou.
Certo dia, nublado e preguiçoso, acordo de manhã. No holojornal, a manchete de capa dizia sobre o homicídio de uma família, mãe e dois filhos, pelas mãos do pai, que supostamente enlouquecera. Vendo o resumo, estranhei a princípio. Muito atípico esse tipo de notícia para a capa, especialmente porque o “Caso Diomedes” estava em voga. Desconfiei que tivesse coisa por trás dessa bagunça. Nem dei bola para a notícia em si.
Mas o caso do homicídio voltou. Ganhou “inexplicável” repercussão na mídia. A opinião pública se dividia sobre o caso, que em outros momentos seria banal. Tive certeza que tinha merda no assunto. E, é claro, merda que sobraria pra eu limpar.
Tentei não me envolver no desdobramento do caso, que foi tomando proporções gigantes. Pessoas manifestavam clamando por justiça. O julgamento dele, polêmico e controvertido, foi televisionado pela Rede, e sua condenação, aclamada. E o que me deixou mais em choque ainda, foi a pena: doze anos de serviço mercenário compulsório para a cidade de Micenas. Tipo... “que diabos? Isso nem faz sentido!”
E, quando dou por mim, recebo em meu escritório uma holomensagem da própria Hera! Sim! Da Intocável em “pessoa”. Na mensagem, ela queria que eu acabasse com o infeliz, usando o serviço mercenário como meio. Queria que eu o enviasse em missões “viáveis”, mas difíceis o bastante para falhar e, preferencialmente, morrer.
E naquele momento tudo se encaixou! O moleque tinha mexido com a “pessoa” errada, e ela não iria deixar barato. Não iria mesmo! E adivinha para quem sobraria o serviço sujo? Isso mesmo: para o Governador de Micenas: EU! Eu teria que despachar o desafeto da Intocável dentro do joguinho que ela havia criado, para provar não sei o que para não sei quem.
Ficou acordado que eu o enviaria em uma missão especial por ano. No resto do tempo, ele agiria como policial na guarda da cidade-estado, auxiliando no policiamento ostensivo (coisa que ele fez muito bem, devo admitir). E aí as coisas foram se complicando.
Hera passou a interferir muito nas missões, sempre por baixo dos panos. O que era péssimo para mim. Eu, que nunca tinha visto um Intocável na vida e só queria ser deixado em paz para fazer o meu trabalho, agora recebia “visitas” regulares por meio das holoprojeções. Nessas “conversas”, basicamente, ela dava ordens enquanto eu apenas consentia, sem me atrever a contrariá-la.
Ela, que aparentava ser uma pessoa bastante sensata e ponderada, mas com o porte e a majestade de uma imperatriz, praticamente se transformava quando falávamos do moleque. Nessas horas, um quê de rancor exalava dela, e um lado sádico vinha a tona, quando você claramente percebia o quanto ela queria vê-lo falhar e morrer, se possível de forma dolorosa. Traçava os planos mais doentios com aquele sorriso de vingança no rosto. Era até macabro de se ver. Ela planejava tudo, e muitas vezes só me informava o que eu tinha que exigir dele.
Era isso. Ela me contatava, fosse à hora que fosse, e me informava os planos para a missão seguinte. Enquanto isso, os papéis chegavam, já prontos, bastando que eu os assinasse e desse o aval oficial.
E assim o enviávamos. Nós o enviamos para combater feras criadas por engenharia biogenética ou mecatrônica, enfrentar perigos sobre humanos. O enviamos seguidamente nas missões mais impossíveis. E o desgraçado sempre voltava vitorioso! Era até ridículo, sabe?
Como eu disse, o garoto é bom. Um soldado perfeito, eu diria. É uma pilha de músculos, com mais de dois metros de altura. Conseguiria vencer uma disputa de forças com um carro sem suar. Talvez até empurrar um blindado com as mãos nuas. Conseguiu, em seu primeiro serviço, enfrentar o leão de “estimação” do presidente da Nemea’s Inc. Aquela abominação genética, que de felino tinha só o nome, foi projetada como o predador perfeito: com sua pele grossa, ele era praticamente invulnerável a tiros, com instintos aguçados para caçar, e um desejo psicótico por sangue. E ainda por cima tinha garras e dentes que podiam cortar até mesmo aço! Vivia, para deleite de seu dono, em uma gaiola energética, almejando escapar. Quando escapou, não me pergunte como, criou uma onda de mortes sem precedentes, até ser contido pelo meu “convidado especial” que, aparentemente, conseguiu caçá-lo, emboscá-lo e matá-lo estrangulado!
Mais hábil que qualquer um dos meus homens. E esperto. Bastante esperto. Com alguns dias de treinamento, ele já conseguia atingir alvos móveis a uma distância de uns trinta metros. Depois de alguns meses, já conseguia usar um fuzil para atingir alvos a mais de cem metros de distância, com margem de erro minúscula. Quando o enviamos para conter o sistema de segurança da filial da Stymfalia AgroCorps, que havia saído do controle, atacando qualquer um que se aproximasse, incluindo funcionários, forçando a empresa a requerer minha intervenção, ele mostrou do que era capaz.
A defesa da subsede da empresa era composta de pequenos robôs voadores, dificilmente maiores que um pombo, que rastreavam, com ajuda das câmeras de segurança do prédio, qualquer alvo dentro do perímetro e o alvejavam com blasters extremamente potentes e precisos. Ao encarar essa situação, ele conseguiu criar algum tipo de onda de choque que acionou todos os robôs que protegiam a área, fazendo com que decolassem e, de fora do alcance programado, abateu um a um com disparos certeiros de um fuzil de precisão.
Ele é uma arma. Praticamente um exército de um homem só. Não há nada que eu ordenasse que ele não desse conta. Derrotou os terroristas do Clã da Hidra sediados na periferia da cidade, desmantelou a facção miliciana liderada pela comandante Hipólita, solucionou os problemas no sistema de tratamento de esgotos da empresa concessionária da cidade em tempo recorde.... Tudo! Até resolveu o “Caso Diomedes” dando um fim naquele psicopata infeliz... Ele deu conta de tudo.
Aliás, parando pra pensar, estou me perguntando como a cidade arrumou tantos problemas desse tipo. Como surgem tantos casos assim? Interferência “divina”, talvez...
Mas dessa vez ele passou dos limites.
A última missão que enviamos ele era simplesmente impossível de ser realizada! Hera tomou todas as precauções para escolher uma tarefa absurda. Quando li os papéis da requisição eu até ri, crente que dessa vez ele não conseguiria. “Dessa vez, Hera terá o que deseja”, pensei enquanto assinava os papéis.
Nós o enviamos para tomar a chave-mestra do sistema operacional da Vesper Corporation. Não tinha como ele ter conseguido. Não dá pra acreditar.
Basicamente, a megaempresa, grande fabricante de softwares e computadores, mantinha a chave-mestra do seu sistema operacional, o Vesper 128-bits, como seu maior segredo. Com ela, seria possível encontrar com mais facilidade brechas no sistema, considerado até hoje o mais seguro e eficiente disponível no mercado. E por isso a empresa não arriscaria deixar que ela caísse nas mãos de ninguém. Tal segredo valeria bilhões. Talvez até mais.
Para assegurar a proteção desse bem tão valioso, a Vesper tomou suas precauções. Guardou suas “maçãs de ouro” no mais avançado cofre jamais criado, situado em sua sede em Tartessos, e projetou o sistema de defesa perfeito em torno dele. Chamou-o de LADON.
O LADON é um sistema de defesa tanto virtual quanto material. É uma inteligência artificial extremamente versátil e astuta, com um verdadeiro arsenal a sua disposição, de lasers e eletrochoques a firewalls de resposta dinâmica. Tão bem programada que é capaz até mesmo de prever ataques futuros e reagir de acordo, aprendendo a partir até mesmo de ações que não aconteceram ainda.
E foi contra esse sistema que enviamos o “nosso herói”.
É claro, já haviam tentado isso. Programadores, hackers, e até mesmo grupos mercenários armados. Todos fracassaram. Os mais sortudos tiveram os neurônios fritos tentando se conectar neuralmente à Rede para tentar invadir o sistema, e agora vegetam felizes em hospitais. Os demais foram mortos de maneiras às vezes bastante cruéis. E tudo isso servia de aviso para quem ousasse tentar invadir o cofre para pegar “as maçãs”.
Hera preparou tudo. Essa era a missão dada. Não tinha como. Era simplesmente impossível que ele obtivesse sucesso. Você me entende? Não tinha como.
E ele conseguiu. O miserável conseguiu de novo!
Eu não sei o que ele fez. Eu não sei como ele deu conta. Mas ele conseguiu. Ele recebeu a tarefa, saiu do prédio e, duas semanas depois, ele voltou com os chips. São um tipo de chip com chaveamento dinâmico. Nem sei explicar, na verdade. Ele conseguiu dar um jeito de conseguir tomar um dos tesouros mais bem guardados do mundo.
E agora eu preciso dar um fim nele de verdade.
Olha, eu não sei o que o moleque fez de errado. Ou mesmo SE ele fez algo de errado. Andei vasculhando uns arquivos: parece que a mãe morreu um ano antes de tudo isso começar. Num acidente doméstico “inexplicado”. Olhando pelas fotos do sistema, ela aparentava ser bastante atraente. Não teve como não me vir à mente até a hipótese de alguma pulada de cerca de um certo Intocável aí...
Mas esse não é o ponto.
O ponto é: tenho que dar um fim nele. Não que eu desgoste dele. É um bom rapaz. Tem coragem. Sabe fazer as coisas mais impossíveis darem certo. Mas mexeu com quem não devia. E agora querem a cabeça dele numa bandeja. Tenho que dar um fim nele, ou vai saber o que não pode sobrar pra mim. Consegui, a muito custo, fazer essa cidade voltar a funcionar. As empresas estão voltando, a região voltou a crescer. Não quero arriscar tudo o que consegui até agora, nem minha carreira, nem nada, por conta de um moleque.
Não quero e não vou. Ele que se foda!
E eu preciso de sua ajuda.
O próximo trabalho dele terá que ser o último. Eu não sei o que a Hera quer provar com esse circo todo. E, no fundo, nem quero saber. O que eu quero é garantir que o meu pescoço esteja no lugar pra aproveitar a cidade que reconstruí das cinzas. Governo Nova Micenas há três décadas, e não quero perder tudo agora que está tudo caminhando bem. Vou enviá-lo para a morte dessa vez. Com seu auxílio.
Estou cobrando o favor do caso das docas. Considere pago assim que esse assunto for resolvido.
Eu preciso dos contatos que eu sei que você tem com “Aquele” Intocável. O que saiu do Paraíso para virar Rei do Submundo. Pode não viver junto com seus “irmãos”, distantes de “nós, mortais”, mas ainda é um deles. Poderoso, mas oculto, controlando seu vasto “reino” como um deus. E eu sei que você, mesmo não tendo um diálogo ativo com ele, sabe como contatá-lo. Há gente na sua cidade que tem os contatos certos no submundo, e conseguiriam mediar sua intercessão nesse caso.
Se tiver aprovação do Intocável, negociarei com Hera, e enviarei “nosso herói” em sua missão final. Ele vai encarar a própria morte e descer à sepultura. E dessa vez para não mais voltar.
Consiga essa mediação de uma forma favorável para resolver esse problema. Esse é o favor que estou cobrando.
Enfim conseguirei voltar a dormir. Nesses últimos meses, não tenho conseguido pregar o olho de pura ansiedade com o que pode acontecer, tanto comigo quanto com a cidade, se atrair para mim a ira de uma Intocável. E de uns tempos pra cá, até o nome daquele infeliz tem me dado gastura.
Hércules.
Nome idiota.